"Poesia" é um filme sul coreano com uma história intensa, que nos remete para a doença de Alzheimer e para os contornos cruéis que a vida pode assumir.
Mija (Yun Jung-hee) é uma mulher de 66 anos que, recuperando uma antiga paixão nunca concretizada, inscreve-se em aulas de poesia. O professor diz-lhe que para encontrar a sua voz terá de observar verdadeiramente o que a rodeia. Só que a realidade de Mija irá revelar-se cada vez mais insuportável.
Ela é uma mulher numa posição extremamente vulnerável, que para lá dos subsídios que recebe do Estado, tem de sobreviver com o que ganha com um part-time a tomar conta de um idoso semi-paralizado por uma trombose. Por motivos não esclarecidos no filme, a filha, que vive numa outra cidade, deixou-lhe o encargo de, com os seus fracos rendimentos, tomar conta do neto.
A somar a esse quadro, um dia uma médica dá-lhe a trágica notícia que sofre de Alzheimer e que os primeiros sintomas, que já começou a sentir, irão em breve agravar-se. Pouco depois vem também a saber que o seu neto é um dos miúdos que repetidamente violaram uma colega de liceu que acabou para se suicidar.
Em rutura com a hipocrisia
Para ocultar o crime, os pais dos outros miúdos planeiam pagar uma "indemnização" à mãe da vítima e Mija tem que arranjar a parte que lhe cabe pelo neto, mas não faz a mínima ideia como o irá fazer.
Nos telefonemas para a filha, Mija continua a ocultar tudo o que se está a passar. Os pais dos outros miúdos pressionam-na não só para arranjar o dinheiro da indemnização, como para ir falar com a mãe da vítima, a fim de a comover, para que não apresente queixa às autoridades pelo sucedido.
Incapaz de lidar com a hipocrisia em seu redor, Mija entra numa espécie de processo de negação, fugindo a tomar uma posição sobre o que se está a passar. É nesse processo que tudo se irá cruzar com as suas aulas de poesia, num percurso que irá trilhar até encontrar alguma harmonia entre a sua realidade e a sua verdade interior.
A complexidade da natureza humana
"O que me atrai é o ser humano. Carrascos ou vítimas, nós nunca somos só uma coisa. A natureza humana é complexa e, como artista, tenho a impressão que a minha função é iluminá-la. Filmo para conhecer o outro e a mim mesmo", declarou o realizador e argumentista Lee Chang-dong ao jornal brasileiro "Estadão".
"Poesia" foi contemplado com o prémio de melhor argumento no Festival de Cinema de Cannes. Chang-dong, que foi ministro da Cultura da Coreia, diz que após ter abandonado o cargo decidiu escrever argumentos o mais simples possíveis.
O resultado foi "Secret Sunshine", um filme sobre uma mulher que após perder o marido e o filho se vira para a religião (que já havia sido premiado em Cannes, nesse caso com a distinção para melhor atriz).
Agora traz-nos esta história sobre uma avó afetada pelo Alzheimer interpretada por Yoon Hee-jeong, uma antiga estrela coreana, que voltou ao cinema para este filme após 15 anos de interregno.
Em exibição nos cinemas.
Cortesia de Expresso
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