Existe uma angústia ácida e dúbia, possante como uma faca, e cujo desmembramento tem o peso da terra, uma angústia em clarões, em pontuação de abismos, apertados e prensados como percevejos, como vermes duros e cujos movimentos estão hirtos, uma angústia em que o espírito se estrangula e se corta a si próprio, - e se mata.
Não consome nada que não lhe pertença, nasce da sua própria asfixia.
É uma congelação da medula, uma ausência de fogo mental, uma falta de circulação da vida.
Mas a angústia opiómica tem uma outra cor, não tem esse declive metafísico, essa maravilhosa imperfeição de timbre. Imagino-a cheia de ecos, e de caves, de labirintos, de reversões; cheia de línguas de fogo falantes, de olhos mentais em acção e do estalar de um trovão sombrio e pleno de razão.
Mas imagino a alma então bem centrada, e todavia num infinito divisível, e transportável como uma coisa que é. Imagino a alma sentindo e que luta e também consente, e faz girar em todos os sentidos as suas línguas, multiplica o seu sexo, - e se mata.
Deve conhecer-se o verdadeiro nada absoluto esfiado, o nada já sem órgão. O nada do ópio traz consigo a orma de uma testa que pensa, que situou o lugar do orifício negro.
Aqui falo da ausência do orifício, de uma espécie de sofrimento frio e sem imagens, sem sentimento, e que é como uma colisão indescritível de abortamentos.
Antonin Artaud
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